Créditos

Direcção,Organização,Redacção: Álvaro Lobato de Faria

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Estêvão Soares - 100 anos do seu nascimento





No dia 16 de Outubro comemoraram-se os 100 anos do nascimento de Estêvão Soares.

Um evento organizado pelos filhos do pintor, com o apoio da SNBA e da Pintora Maria Gabriel.
O MAC, pela presença do seu Diretor Dr. Álvaro Lobato de Faria, participou na Sessão de Homenagem e inauguração da exposição do artista que teve lugar na Sociedade Nacional de Belas Artes.

"Não há aqui nenhum segredo de técnica, nenhum artifício de moda, nenhum clima literário de escola, mas apenas o seu instinto, a sua rica sensibilidade, que o faz lembrar os grande modernos - sem se parecer com eles."

Celestino Gomes, in "Artes e Letras" - 1949














sexta-feira, 17 de outubro de 2014









Intervenção de
Álvaro Lobato Faria
sobre a obra do Medalhista e Escultor João Duarte,
na Galeria do Sindicato dos Professores, em Lisboa




6 de outubro de 2014




Exposição
Escultura e Medalhística


Escultura
João Duarte, escultor de grande mérito nacional e internacional, apresenta-nos, mais uma vez, o seu universo criativo, onde se destaca a sua grande capacidade e talento de um mestre das formas, notabilizando-se com as suas esculturais "Deusas Mater" que Ele recria num clima próprio com a sensibilidade critica e pureza técnica, de quem não só cria arte, mas Ele próprio é arte. Arte de viver, de ver o mundo e de o transmitir nas suas esculturas, como um guia do pensamento.

Com uma enorme convicção e coerência, este grande escultor, desenvolve a sua obra, como quem respira, apresentando-nos algo que, num relance de raiz tecnológica, numa invasão total do belo, transcende a natureza da matéria, mostrando-se, João Duarte, um apaixonado pelo seu trabalho e esta e a sua principal qualidade como artista e como grande executor do que é belo e nos fascina.

Nesta sua excelente exposição de escultura, João Duarte recria sonhos, descrevendo mundos, registando imagens inesquecíveis, que tão intensamente nos marcam.

Para participar da proposta estética e intelectual que João Duarte nos faz, há que superar um primeiro nível de análise, pois o que Ele manifesta através da sua escultura, são ideias, pensamentos e conceitos plenos de paixão e energia, contundentes na sua construção, no seu tratamento e morfologia. Uma filosofia da existência.

Com lugar de crescente destaque no cenário artístico português, o scu trabalho, originário de profunda reflexão, fertiliza-se por força de um quotidiano artístico, rigoroso e impecável, pelo que poderemos afirmar que é quase impossível traçar a história das artes p1ásticas portuguesas, sem referência ao trabalho e à presença deste grande escultor que é João Duarte.

Álvaro Lobato de Faria
Diretor-Coordenador do MAC
Movimento Arte Contemporânea


 
Medalhística 
João Duarte: um pioneiro da medalha-objecto em Portugal
Desde a fundação do MAC, que o João Duarte tem sido um verdadeiro amigo e um colaborador activo constante, expondo com regularidade o seu trabalho de escultura e de medalha, contribuindo também, deste modo, para o prestígio do MAC – Movimento Arte Contemporânea.

É nesta perspectiva que, no ano de 1997, o João Duarte, me solicitou uma exposição individual de toda a sua obra de medalhística.

Era um desafio que eu nunca tinha tido.

Solicitei-lhe fotografias das suas peças e estava à espera de umas medalhas comemorativas, de grande realismo, com uma distribuição com grandes critérios de claros-escuros, valorizando deste modo a forma redonda das medalhas, que normalmente se encontram no mercado.

Quando me foi apresentado o seu dossier fiquei imediatamente liberto dos conceitos clássicos do que vulgarmente chamam “medalha”, para acrescentar a denominação de “objecto”, e é nesta transformação que, pela primeira vez em Portugal, um espaço cultural comercial abriu as portas à Medalhística

O MAC – Movimento Arte Contemporânea teve esse privilégio.

De ano para ano, João Duarte afirma o papel de mestre que lhe cabe como medalhista maior que é, como artista que assume de corpo inteiro o lugar que lhe compete, cuja obra desenvolveu, repartiu e frutificou neste esplêndido conjunto de medalhas que agora nos apresenta.

O carácter de ficção é um dos elementos constitutivos da obra de João Duarte.

É coisa muito séria e necessária, além de ser reclamado como um “direito de autor”.

Os jogos e os “brinquedos” fazem parte da vida do João tanto quanto ele vive num mundo de fantasia, de encantamento, de alegria, de sonho, onde realidade e faz-de-conta se confundem. “Brincar” está-lhe na génese do pensamento, da descoberta de si mesmo, da possibilidade de experimentar, de criar e de transformar o mundo.

Enquanto o “jogo” dura, as regras que regem a realidade quotidiana ficam suspensas. E é assim que tem de ser.

O João é o medalhista que brinca. O Homo Ludens de Huizinga que aprimora a capacidade lúdica como uma categoria absolutamente primária, tão essencial quanto a fabricação do objecto ou o raciocínio que lhe antecede.

Dá forma a mentefactos, objectos ou representações mentais de coisas, situações, ocorrências externas e vivências interiores conscientes ou emocionais.

Como um verdadeiro microcosmo, a obra do João Duarte estabelece-se como uma realidade fascinante, diversa da arte contemporânea, possuidora de tempos, espaços, regras, valores e objectivos específicos.

É este o sentido, a forma e o modo como o João Duarte interiorizou e desenvolveu o papel da medalha como Objecto de Arte, transformando o conceito tradicional de medalha num outro – a medalha como Objecto Lúdico. Objecto de conhecimento na relação que estabelece com o fruidor que dele participa, captando-o segundo as formas adquiridas à priori e as categorias inatas ao intelecto.

Estava-se no final da década de 70 na então Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, à cidade de São Francisco. Emergia um esforço encetado pelo Professor Escultor Euclides Vaz no sentido de incrementar a medalha como tecnologia da licenciatura de Escultura.

Entre os primeiros curiosos, o João.

A medalha situava-se agora entre a ordem e a desordem, constituindo-se já como um instrumento de uma nova sociabilidade, com limitações e oferecimentos.

Do emaranhado de experimentações iniciais ressaltavam agora, de uma forma mais ou menos clara, as primeiras propostas concretas realizadas ao longo da última década – José Aurélio, Irene Vilar, José Rodrigues, Charters de Almeida, José João Brito ou Clara Menéres aventuravam-se a desbravar caminho, entre tantos outros.

Aparentemente, a medalha “jogava-se” com uma realidade que se regia por regras convencionais, convencionadas e racionais, provavelmente razoáveis e aceites por todos os intervenientes. Mas no João gerava emoção, excitação e fascínio.

Apesar do seu regramento, a medalha manifestava-se imprevisível, abria uma brecha, um intervalo no quotidiano, no “sério”, abria um leque de possibilidades, um tipo moderado de loucura, que determinava a carga intensa e múltipla de significados que se propunha desenvolver.

Transcendia a finalidade e o sentido comemorativos, conferindo-lhe uma carga “festiva”.

Parentescos à parte, com relação ao estudo de um amplo conjunto de comportamentos que inclui as primeiras experimentações plásticas, João Duarte pode ser considerado como o primeiro a encetar esforços no sentido de estabelecer uma praxis no campo da medalha contemporânea, dependente, exactamente, da modalidade ou característica lúdica que lhe serve à argumentação.

De “menino bonito” a “enfant terrible” da medalhística portuguesa, faz parte da sua história por representar uma conquista fundadora. Só por isso tem direito ao seu lugar.

A par dos avanços técnicos, estético e até culturais que materializou, o que mais impressiona é que ainda hoje, mais de duas décadas passadas, quando tudo mudou, o João se mantém firme, testemunhando uma vanguarda que o tempo não apaga.

A sua obra tem sede própria – ensaia composições, recorre a materiais variados, aplica a pluralidade das cores.

Misturando o bronze com outros materiais, cria peças com um novo sentido para o fruidor, podendo este intervir, desagregando e reconstruindo o objecto, como se de um puzzle se tratasse.

Como no desenrolar de uma paixão, as certezas fortaleciam-se nas conquistas que alcançava. Os primeiros prémios, o reconhecimento nacional, a primeira internacionalização (em 1988, no XXI Congresso Internacional da FIDEM, em Colorado Springs, por recomendação do gravador Vasco Costa).

A medalha apresentava-se como um campo cada vez mais complexo e fascinante, com maior ou menor nitidez, maior ou menor ocultação. Uma aparência entendida como aquilo que parece ser, mas que possibilita qualquer coisa de diferente e até de oposta.


Na década de 90, logo após a aposentação do Professor Hélder Batista, assume a regência da cadeira de Medalhística na então Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, e traça o rumo para as gerações vindouras. Um rumo que convoca de imediato duas premissas de base: a diferença e a complementaridade.

Uso, transformação, recriação – o abandono de preconceitos amarrados a uma noção erudita, elitista, virtuosa e redutora da medalha.

A estandardização, aos poucos, dá lugar à aspiração de originalidade. A busca de objectividade extrema abre lugar à inquietação da subjectividade que determina a sua carga intensa e múltipla de significados – a produção de sentido.

O João Duarte levou as velhas e novas gerações de escultores a interessarem-se pelo estudo da medalha enquanto obra de arte, inculcando-lhes a ideia de liberdade de criação de um objecto que pode ser manipulado de uma forma diversa, não forçosamente como sinal comemorativo de algo, mas sim, como objecto com lugar próprio e bem definido no campo da universalidade da arte.

Eficiência e honestidade. A dupla face do João. Conta o que está e os que estão e à sua volta está uma “movida” imparável que lhe estimula a criatividade. Alimenta-os e alimenta-se deles.

Com o VOLTE FACE – Medalha Contemporânea[1] (actual Secção de Investigação que coordena na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa) comemorou já as bodas de prata.

Verdadeiramente inovador, medalhista de referência, João Duarte criou como ninguém antes nem depois, um outro estatuto para a Medalha, integrando-a de uma forma definitiva no panorama das artes plásticas portuguesas.

Adoptando uma perspectiva ampla, nas suas variantes ideológica, formal e pedagógica, que lhe permite melhor agarrar a complexidade e heterogeneidade do campo operativo, não corre riscos de se perder num horizonte sem fronteiras mínimas, recorrente a pequenas imitações, simbólicas ou padronizadas de multiplicação ad infinitum.

Abrir caminho é tarefa para os audazes. E o João faz parte dessa classe “dirigente” que olha para a frente e projecta o futuro.

Nos últimos anos confirmou-se a consagração que há muito vaticinámos: em 2010, foi distinguido no 31º Congresso Mundial da FIDEM pela sua contribuição excepcional para o incremento e divulgação da medalhística; em 2011, com o “J. Sanford Saltus Award”, prémio mundial atribuído pela American Numismatic Association, equivalente a um Nobel da Medalhística; em 2012, criou a medalha anual do British Museum; e em 2013, foi finalmente homenageado com uma obra monográfica dedicada aos seus 30 anos de produção medalhística e numismática, há muito desejada.

Em 2014 em reconhecimento do seu trabalho de excelência, no campo da medalhística, na sessão de entrega dos prémios da 33ºCongresso Mundial da FIDEM realizado em Sófia, na Bulgária, foi-lhe atribuído a Medal of Honor “Medallist Honoris Causa” .

Costuma definir-se como o homem a quem “tudo apareceu no tempo certo”, mas nós sabemos que tudo lhe apareceu pelo muito investimento artístico, pelo muito investimento humano. E é por tudo isto que este ano atribuímos o Prémio MAC`2014 PERSONALIDADE CULTURAL DO ANO, ao escultor, professor e amigo JOÃO DUARTE.

Álvaro Lobato de Faria
Diretor-Coordenador do MAC
Movimento Arte Contemporânea
 




Fotos gentilmente cedidas por: Paulo Machado

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

João Duarte Honoris Causa da Medalhística

João Duarte, um artista do MAC - Movimento Arte Contemporânea, possuidor de uma linha de trabalho na área da medalhística sobejamente reconhecida a nível Nacional e Internacional, sustenta o seu trabalho numa pesquisa permanente de novos caminhos e formas de direcionar o olhar sobre a medalha, daí resultando obras de elevada originalidade, quer na forma quer nos materiais a que recorre, fato pelo qual tem sido ao longo da sua carreira reconhecido e galardoado com imensos prémios nesta área artística onde é mestre.

Assim, é com grande prazer que o MAC comunica, que em reconhecimento do seu trabalho de excelência, na sessão de entrega de prémios da “FIDEM XXXIII Art World Congress 2014”, realizado em Sofia, na Bulgária, o Medalli
c Sculpture Studio da National Academy of Art Sofia, representada pelo Professor. Bogomil Nikolov, conferiu a ”MSSS Medal of Honor "Medallist Honoris Causa" ao escultor João Duarte pelos méritos especiais no campo da medalhística.

Parabéns João Duarte 


quarta-feira, 12 de março de 2014

Intervenção sobre a obra do escultor Mestre Virgílio Domingues





Intervenção de
Álvaro Lobato Faria
sobre a obra do escultor Mestre Virgílio Domingues,
na Galeria do Sindicato dos Professores, em Lisboa

24 de Fevereiro de 2014

"Virgílio Domingues, escultor de grande mérito nacional e internacional, apresenta-nos, mais uma vez, o seu universo criativo, onde se destaca a sua grande capacidade e talento de um mestre das formas, notabilizando-se com as suas esculturas que Ele recria num clima próprio com a sensibilidade critica e pureza técnica, de quem não só cria arte, mas Ele próprio é arte. Arte de viver, de ver o mundo e de o transmitir nas suas esculturas, como um guia do pensamento.

Com uma enorme convicção e coerência, este grande escultor, desenvolve a sua obra, como quem respira, apresentando-nos algo que, num relance de raiz tecnológica, numa invasão total do belo, transcende a natureza da matéria, mostrando-se, Virgilio Domingues, um apaixonado pelo seu trabalho e esta é a sua principal qualidade como artista e como grande executor do que é belo e nos fascina.

Nesta sua excelente exposição Virgílio Domingues recria sonhos, descrevendo mundos, registando imagens inesquecíveis, que tão intensamente nos marcam.

Para participar da proposta estética e intelectual que Virgílio Domingues nos faz, há que superar um primeiro nível de análise, pois o que Ele manifesta através da sua escultura, são ideias, pensamentos e conceitos plenos de paixão e energia, contundentes na sua construção, no seu tratamento e morfologia. Uma filosofia da existência.

Com lugar de crescente destaque no cenário artístico português, o seu trabalho, originário de profunda reflexão, fertiliza-se por força de um quotidiano artístico, rigoroso e impecável, pelo que poderemos afirmar que é quase impossível traçar a história das artes p1ásticas portuguesas, sem referência ao trabalho e à presença deste grande escultor que é Virgílio Domingues.

Desejo-lhe grande Amigo, muitas felicidades e os meus parabéns, por esta grande exposição de escultura, que certamente só nos irá continuar a surpreender pela sua tão brilhante sabedoria."
Álvaro Lobato de Faria
Diretor Coordenador do MAC
Movimento Arte Contemporânea                                       




quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Palestra apresentada no âmbito da inauguração da exposição: Arte e Sáude Mental
Curador: Dr. Álvaro Lobato de Faria

A defesa e promoção de actividades relacionadas com a utilização de recursos artísticos nos serviços de saúde mental encontra-se, desde longa data, em consonância com uma das directrizes fundacionais do MAC – Movimento Arte Contemporânea, que se traduz na utilização do processo criativo como exercício subjectivo para o encorajamento e construção de novas éticas e estéticas de existência.
Enquanto Director-Coordenador desta instituição de promoção cultural, foi com enorme prazer que abracei este projecto a convite do Dr. Álvaro Andrade de Carvalho, Director do Programa Nacional para a Saúde Mental, que desde já saúdo por mais esta iniciativa que visa, acima de tudo, a “defesa do direito à livre expressão artística”, permitindo-se questionar, e até mesmo romper, com as visões estigmatizadas das pessoas com doença mental, fomentando a sua inclusão e autonomia.
Contrariando o modelo baseado no alienismo e no enclausuramento das pessoas com doença mental, a valorização das competências artísticas dos portadores destas doenças que tem vindo a ser efectuada pelo Programa Nacional para a Saúde Mental, e que envolve a luta e a dedicação de muitos intervenientes, evolui pelo esforço comum de humanizar os tratamentos e pela defesa de um conceito de saúde como direito humano fundamental, que ultrapassa a ideia simplista da ausência de doenças, afirmando-se antes como componente primordial da qualidade de vida, da qual o livre acesso à arte é indissociável.
Numa sociedade que tem a necessidade de criar padrões, todos os que assumem uma configuração de diferença, acabam por se tornar incompreendidos, assustam, ameaçam os valores de “normalidade” instituídos. Este facto, em muito tem contribuído para o isolamento das pessoas com doenças mentais como forma de protecção da restante esfera social. Mas apesar deste medo ampliado, permitam-me afirmar que a arte é esse espaço onde o são e o insano se conjugam, se confundem, se reconciliam, com total liberdade e legitimidade.
A inclusão da arte como terapêutica alternativa no contexto da saúde mental, tem vindo a traçar as linhas de novos e deslizantes territórios, de contornos ainda indefinidos, onde as categorias tradicionalmente utilizadas pelos padrões críticos ou estéticos anteriormente forjados não encontram oportunidade.
A associação entre as perturbações mentais e a produção artística faz parte da história da humanidade, ganhando relevância no final do séxulo XIX e atingindo especial destaque em 1945, data em que o pintor francês Jean Dubuffet realçou esta pureza do impulso artístico através do termo «Arte Bruta», referindo-se à arte pura, natural, versão livre da figuração psicológica que transcende ou ignora a diferença entre as frágeis fronteiras da sanidade e da inconsciência, que pouco ou nada deve à arte convencional e aos clichés culturais, voltada antes para a integridade do ser existencial.
Produzida por criadores anónimos, espíritos exilados e arredados dos circuitos artísticos profissionais, logo, livres de qualquer influência de estilos oficiais ou imposições de mercado, a Arte Bruta, mais do que um fim, é um meio, que utiliza as emoções mais profundas como utensílios de trabalho.
Para compreender toda a extensão e complexidade das reflexões e afirmações estéticas que estes artistas propõem, haveria que encontrar e inventar outras categorias e modelos interpretativos, bem como outros horizontes de entendimento crítico, histórico, estético ou sociológico.
Fortalecendo e valorizando a diversidade por via de distintas linguagens e abordagens que visaram a inclusão, a desconstrução de preconceitos, o incentivo à tolerância e o respeito pela diferença, os teóricos da Arte Bruta insistem em defender que aqueles que passam pelo grande sofrimento do rompimento com a realidade, do mergulho sem protecção nos abismos do inconsciente, podem, por meio da expressão artística, buscar o caminho de volta para a superfície, e ainda que ameacem destruir a comunicação comum, possibilitam uma comunicação outra, mais genuína, mais directamente relacionada com as fontes de criatividade do que a arte tradicional conscientemente produzida. Ainda que possa existir um corte de comunicação com o mundo, não existe um corte de comunicação com o outro.
Injustamente ignorada, criada em condições muito particulares de silêncio e solidão, existe então esta arte anónima, inconsciente do seu próprio nome e das suas potencialidades, nomeadamente, da sua espontâneadade e autenticidade expressiva.
Frequentemente denominada de primitiva, virgem ou crua, esta arte reivindica que a liberdade da criação é infinita e assiste por direito a qualquer homem, com ou sem formação específica, detentor ou não de condicionalismos físicos ou psíquicos.
Por alguma razão, determinados criadores, habitantes de mundos paralelos, escapam do conformismo social e dos condicionamentos culturais institucionalizados. Nos domínios da pintura, da escultura ou da fotografia, estes artistas de invulgar sensibilidade, afirmam um discurso original, e através dos distintos elementos das suas caligrafias pictóricas ou escultóricas, multiplicam os diálogos paradoxais da condição humana.
Ludibriando a razão, desvalorizam as hipóteses de sentido, de finalidade e de resposta aos “porquês” que o socialmente aceite tanto insiste em colocar. Perante as suas obras, a única realidade é a da sua própria imaginação, mais dependente de um qualquer estado de espírito do que de qualquer estilo específico, cultivando apenas a crença de que a emoção, a visão interior, é tão ou mais importante que o mundo concreto.
Seres dotados, detêm uma vontade livre e em virtude desta liberdade contornam as características fixas e reguladoras e exprimem um mundo só seu, um mundo que é a reflexão desse complexo de instintos e pensamentos, sentimentos e emoções, a que chamamos personalidade.
Marginalizados ou exclusos, mantêm-se salutarmente inconscientes das tradições académicas ou das modas vanguardistas, são indiferentes às críticas e, maioritariamente, únicos destinatários das próprias obras.
Deserdados da sociedade, agem por instinto, por estados, dores ou delírios de alma – complexos, intrincados e intensos –, mas falam uma linguagem primordial, um léxico que recorre a vocábulos puros e acessíveis a todos, e a sua imperiosa necessidade de expressão enobrece qualquer forma, seja qual for o tipo de suporte, o tipo de matéria, o tipo de processo para alcançar um resultado.
Fosse aquilo que eles fazem igual àquilo que todos fazem e ser-nos-ia totalmente desnecessário continuar a assinalá-los, a relembrá-los, a homenageá-los. Acontece, porém, que toda a herança estética que nos legam, é necessária precisamente porque nos impede de descansar em cima de conceitos e valores estandardizados ou canonicamente correctos.
Falar da obra destes estes artistas que não sabem que o são, é falar do sonho, logo, não pode ser racionalmente explicável em prejuízo de perder metade do sentido pelo caminho.
Aceitando a ruptura entre razão e imaginação, tornamo-nos capazes de validar esse reino imaginário que nos é estranhamente sinistro, cheio de incongruências que nos perturbam mas, no limite, nos fascinam. Pelo contrário, se ambicionarmos dissecar este universo, teremos de tecer complicadas considerações racionais no intuito de explicar coisas que só os sentidos entendem à primeira. Há em cada pormenor saído das mãos destes pintores, escultores ou fotógrafos, um elemento mágico que reclama a nossa atenção.
Ao serem reconhecidos publicamente como artistas, estes criadores são capturados pela rede cultural e incluídos na sua órbita, depois de terem vivido um período de exclusão. Neste sentido, a valorização da auto-estima que a arte possibilita aos portadores de doenças mentais é significativa da reorganização psíquica e da reinserção social que a partir deste processo se potencia, exteriorizando e exorcizando a condição de passividade e incapacidade erróneamente associada à doença mental.
Crendo que é condição de qualquer fruidor de obras de arte uma alma de explorador, não poderia, ao longo da minha carreira de galerista, comissário e curador de arte contemporânea, deixar de ficar indiferente a estes mundos desconhecidos, verdadeiros tesouros muitas vezes confundidos com delírios e alucinações, mas bem reais para as pessoas com doença mental. E não será que o delírio e a alucinação provêm do mesmo impulso libertador e catártico a que chamamos inspiração?
A imprecisão das distintas definições de arte que conhecemos, acontece porque em todas elas se considera como objectivo da arte a obtenção de prazer estético e não o seu propósito na vida da humanidade. E é bem provável que a arte seja indefinível e que o eterno debate em torno das suas características particulares seja inglório, mas de uma coisa estou certo, alcançar a essência da arte passa por deixar de olhar para ela como um veículo de prazer hedonista e analisá-la como uma das condições de bem estar da vida humana.
Assim considerada, a arte é por excelência um meio de comunhão entre as pessoas. Todas as pessoas. A experiência estética da criação que é hoje utilizada como forma de expressão e comunicação pelos portadores de doenças mentais, pode e deve, então, ser rentabilizada no sentido de criar novos territórios de acção que ultrapassem a simples função terapêutica, proporcionando o enriquecimento dos reportórios da subjectividade expressiva.
Qualquer obra de arte faz o fruidor entrar em comunhão com aquele que a criou e, simultaneamente, com todos aqueles que antes ou depois dele tiveram ou terão a mesma impressão artística. A particularidade deste meio de comunicação, distinto da comunicação por via da palavra, consiste no facto de que pela palavra a pessoa transmite a outra os seus pensamentos, enquanto pela arte, a pessoa transmite a outra as suas emoções e sentimentos mais profundos e ocultos, o seu labirinto de significações, o espelho da sua alma.
A função primordial da arte é então baseada no facto do homem que recebe a expressão de outro homem ser capaz de experimentar o mesmo sentimento que aquele experimentou e expressou por sinais, formas, linhas ou cores. Ora, é nesta capacidade das pessoas serem contagiadas pelos sentimentos de outras pessoas que a terapia pela arte surge como derradeira intermediária das relações sociais.
A verdadeira arte é a expressão imaginativa da emoção, da experiência mágica de comungar o sentimento do outro, que aposta numa certa visão das coisas que é própria das crianças e talvez de certos adultos, cada vez mais raros, que não são mitigados por quaisquer experiências “adequadas” e que mantêm viva essa qualidade infantil de um olhar que ainda não foi distorcido pela influência do pensamento racional ou dedutivo, um olhar que aceita a correlação das incompatibilidades, a auto-suficiência das imagens que, pelo acto da intuição poética, se constituem mistérios que ultrapassam a nossa faculdade lógica.
A arte produzida por pessoas com doença mental, hoje merecidamente aqui glorificada, evita, por definição, os olhares alheios dos públicos das galerias ou dos museus, não reivindica estatutos ou legitimações, antes transgride as normas da “arte estabelecida”, sendo a sua única preocupação a de criar, a de comunicar diálogos interiores que necessitam ser exteriorizados. Porque de todas as formas humanas, a única que não oprime é a arte.
A acção destes artistas não cabe em compêndios nem em enciclopédias. Na sua ambição pueril, têm-se isolado para se encontrarem a sós consigo mesmos, num diálogo comprometido com as pulsões do subconsciente que por vezes só eles entendem, mas que generosamente doam aos outros homens.
A utilização de recursos artísticos como possibilidades terapêuticas alternativas, enfatiza, a meu ver, não só o carácter multifacetado da saúde, que engloba o bem estar físico, o bem estar psíquico e o bem estar social, mas também a defesa da diversidade humana, que tem de ser aceite e valorizada como uma virtude e não como um defeito.
Na arte como na vida, conviver com a diferença é uma necessidade vital que nos distingue como seres humanos, e nunca o mundo necessitou tanto dessa convivência e aceitação como nos dias de hoje.
Porque as pessoas são pessoas, não são doenças, os sentimentos dos autores que hoje aqui homenageamos, variadíssimos, fortes, significantes, conscientes ou inconscientes, contagiam os fruidores da mesma maneira que contagiaram os seus criadores, constituindo-se as suas emoções as matérias moldáveis da arte.
É na substância dos sentimentos que estes artistas encontram os seus significantes mais próximos e, através deles, empreendem a travessia da plasticidade, viagem de lá para cá, num percurso de significação e transmutação da sua “realidade sonhada”, aqui e além atravessada por um rasgão, um grito de alerta, como que a dizer: – Eu estou aqui! Também eu tenho o direito de aqui estar!


Álvaro Lobato de Faria
Director Coordenador do MAC
Movimento Arte Contemporânea


Catálogo da exposição: Arte e Saúde Mental
Texto por Dr. Álvaro Lobato de Faria

"Arte é tudo aquilo que os homens dizem que é arte"
Num universo povoado e multiplicado por um sem número de sensibilidades e razões, resultantes estas de vários sistemas de estrutura gregária é-nos dada a consciência da existência de uma actividade humana a que chamamos ARTE.

Como diz Dino Fromaggio: “Arte é tudo aquilo que os homens dizem que é arte" podemos então assim admitir que qualquer forma de expressão plástica é Arte, independentemente da sua categorização ou do seu patamar de explicitação ou catarse.
No entanto, toda a expressão plástica tem por detrás de si uma forte necessidade de comunicação. É uma linguagem” permissiva” que abarca toda a possibilidade de comunicação, mesmo de diálogo interior.
Ainda que esse mesmo não seja intencional e consciente de mim para o “outro” ou para “eu” próprio.

A abrangência da arte é global e presta-se a várias definições e aquisições para o seu “campo”, havendo uma confusão de conceitos através dos tempos, a partir dos quais os académicos e estudiosos tentam estruturar e circunscrever aos objectos em acto que podem e devem figurar no campo da Arte.

Actualmente, configuramos no campo artístico as pinturas pré-históricas das quais muitos significados ainda desconhecemos. Porém, essas “obras” contêm já os elementos plásticos que serviram a Kandinsky para a sua teoria e defesa da Arte Abstrata.

A diferença temporal e os vários patamares civilizacionais que decorreram entre a sua execução é de séculos e só no séc XV e, por razões teóricas, se incluem esses “ grafitis” no território da arte.


A Arte é  expressão interior e objectivação no mundo exterior

A realidade, sabemos, não é como a percepcionamos, por isso mesmo é necessária uma aprendizagem que nos leve a mover-nos no mundo real, no autêntico que, muitas vezes, nos escapa e confunde.

O individuo que se sente legado para “círculos” que o marginalizam e estigmatizam por uma ou outra razão considerada patológica tende a iludir-se no seu “refúgio” criando à sua volta uma barreira que impede a coparticipação e contacto com os seres que constituem as estruturas das sociedades na sua complexidade.

Assim, no subentendimento da expressão plástica podemos tomá-la também como uma terapia generalizada na comunicação do “eu” para com o mundo, comunicação essa que por vezes se torna impossível por razões temporais, interculturais ou de outra ordem.

Para tomar um ou dois exemplos já consagrados na história mundial da arte, podemos citar um Baselitz ou um Pollock.

No primeiro caso, Bazelitz opta por inverter formalmente o que lhe é representado como real, como se a ordem das forças físicas que nos mantem se invertessem e o mundo vivesse ao contrário de si próprio.
Poder-se-ia apostar aqui num tipo de análise que não cabe no nosso campo, tal como acontece com Pollock em cuja obra impera o caos que não sabemos se dominava na sua atmosfera psíquica ou se o autor quereria comunicar ao mundo um ”retrato de época”.

Falando também de intervenções que podem ser consideradas como artísticas e de integração consideraremos a arte infantil. No campo da arte infantil encontramos várias criações de “novos mundos” para a criança, de forma a auto inserir-se no mundo que a rodeia, mas à sua maneira. Por uma forma que a pouco e pouco, ela possa compreender o mundo que a rodeia, apresentando-o de início como quer (de uma forma simbólica) e impondo ou opondo, desde logo, o seu “posicionamento” individual ao seu autêntico habitat social.

De qualquer forma a terapia pela expressão plástica é extensível aos considerados artistas consagrados. A obra constitui um acto catártico em que o autor se revê como se o mundo fosse, não como é , mas como ele quereria que fosse. É a aproximação a uma outra realidade, a uma necessidade de vivenciar um outro mundo feito à sua imagem interior.


A inserção social da obra contribui para a subjectividade do seu autor.

É na expressão do seu interior que o autor se propõe mostrar ao mundo tal como é, na sua fragilidade e potência, num modo terapêutico de autoconhecimento e realização de identidade.

Essa expressivadade do sujeito pode ser vista não só como uma defecação mental mas também como um potencial acesso ao outro, ou seja, ao aparecerem no âmbito de uma exposição - acto social - estas obras serão vistas por outros, o que acentua a subjectividade do autor por meio de um entrelaçamento intersubjectivo com aquele que contempla a sua obra.
O autor, e em particular nestes casos, é assim retirado da sua quase absoluta solidão e integrado mesmo que parcialmente, num circuito social.

As iniciativas deste género são assim, verdadeiros contributos para combater um dos maiores flagelos dos nossos tempos: a solidão humana.

Álvaro Lobato de Faria
Director Coordenador do MAC - Movimento Arte Contemporânea


Divulgação internacional:





quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Votos de Feliz 2014


O MAC- Movimento Arte Contemporânea, deseja a todos um Feliz 2014.
Comece o ano a ver Arte!
Aguardamos pela sua visita.